frança fantasma
Um diário de campo no sentido estrito
quinta-feira, 7 de julho de 2011
De volta ao Rio
Rio, 25 junho 2011. Aterrissei no Galeão às 4h40 da terça-feira passada, dia 21. Em Paris, o dia já ia firme por volta das 10h, iniciando oficialmente o verão com a Fête de la Musique, que espalhou palcos e acordes por toda a cidade. Isso me fez pensar sobre meu timing (ou falta de), afinal embarquei para Paris uma semana antes do carnaval e voltei um dia antes da Festa da Música. No Rio, o inverno dava o ar de sua debilidade, sufocado em úmidos 20 graus, saudando minha chegada de um séjour de quatro meses em terra estrangeira. Cheguei mais magro do que quando parti, mas a verdadeira transformação é mais difícil precisar. Ela ainda está se dando, neste exato momento, em que perambulo pelo limbo do não-lugar, efeito do déplacement, já tão mencionado nas linhas deste diário de campo.
Os franceses, seres deliciosamente estranhos, têm uma expressão — “coup de foudre” — que é mal traduzida nos demais idiomas como “amor à primeira vista”. É uma interpretação precária, pois não traz o vigor expresso na idéia de “golpe” ou de “raio”. A força luminosa que atravessa, num zás repentino e inesperado, o espírito humano, transformando-o para sempre. Um impacto fulminante, normalmente amoroso, que, como dizia Claude Lévi-Strauss, convida a alma a retornar ao corpo.
É uma espécie de transe que torna o olhar sideral, concentra-se no cerebelo e paralisa o sistema nervoso central. É como um veneno que se espalha por veias e artérias, tetaniza os músculos, sobretudo os respiratórios, e queima a pele. Tremores, suores e paixão. É uma força mais dionisíaca que apolínea. Subverte qualquer lógica. É o Descartes emaranhado no Catatau de Leminski: perdido nos trópicos, ele fuma o estranho tabaco que lhe oferece o pajé, em frente ao mar da costa pernambucana, e desconstrói a idéia de razão, dissolvendo-a num inquietude verbal.
O português também inventou, com seu lirismo, uma expressão para essa “ocorrência silenciosa”, como diria Manduka, referindo-se ao seu caráter de explosão interna. Trata-se da idéia de “saudade”, igualmente mal traduzida nos demais idiomas como nostalgia. Mas saudade, com sua intensidade intangível, expressa o coup de foudre na condição já de perda, de algo que aconteceu ou que poderia ter acontecido e se perdeu no tempo e, exatamente por isso, retorna como assombração e encantamento. O transe, embora insuportavelmente intenso, já era e só pode ser percebido como experiência vivida. É Riobaldo, estupefato, descobrindo a mulher oculta no corpo morto de Diadorim. É o sortilégio do passado.
Coup de foudre e saudade são, assim, duas expressões de impetuosidade fulgurante, mas que, no caso francês, se dá no instante. E, para mim, viajar é uma espécie de coup de foudre e certamente uma saudade. É apaixonar-se perdidamente de um só golpe pelo “outro”, mesmo que esse “outro” seja, mais que carne e osso, uma suposição, um universo alheio e distinto.
Essa viagem foi um raio que me iluminou num sobressalto. Em parte pelo déplacement, com certeza, mas sobretudo pelas pessoas com quem interagi. Pessoas que me acolheram, abrigaram e me deram alguma noção de porto, ao mesmo tempo em que, sem querer, tiraram meu chão, ao me mostrarem outro mundo possível. Ao sair do efeito da hipnose, não sou mais o mesmo. Não vejo mais o mundo da mesma maneira. E tampouco saberia precisar o que mudou, pois se trata de uma ebulição em andamento e inconsciente. Ao olhar as anotações deste diário talvez encontre pistas do fenômeno. Mas acho desnecessário. Então, encerro o blog por aqui, com algumas imagens que registrei após as últimas anotações, que foram ficando cada vez mais esparsas, à medida que minha alma se dissolvia no dia-a-dia desta cidade. Continuo, no entanto, escrevendo no velho Pendura Essa, cujo link encontra-se abaixo. A bientôt!
quinta-feira, 2 de junho de 2011
Beatniks, hippies e punks: a América em Paris
Essa imagem aparece reproduzida em outros quadros de Prince. Ela chama a atenção pela perversidade quase inocente
Paris, 2 junho 2011. Tenho passado os últimos dias num apartamento, cuja varanda dá para o canal de l’Ourc, no 19ème. Trata-se da casa do sociólogo Pedro García Sanchez e sua mulher, Hèlene, que viajaram e deixaram o apê comigo. Desse modo, dou uma folga para Ruben, Marta & Lorenzo (que teve provas essa semana) e também aproveito o silêncio e a solidão para avançar nas leituras, escrituras e organização dos dados de minha pesquisa. Tarefa hercúlea e cansativa, que exige muita concentração. Ontem, praticamente não pus os pés na rua, apesar do céu insuportavelmente azul e a temperatura agradável. Mas aproveitei para organizar a estrutura da monografia e já comecei a escrever a introdução, que é mais chatinha porque vou discutir uma série de conceitos e explicar minhas opções teóricas e metodológicas.
Hoje, em compensação, aproveitei o calor de 26 graus e caminhei daqui à casa de Marta e, depois, até o Marché d’Aligre, onde, quase desidratado, tomei uma cerveja no Penty. Não sei medir a distância, mas foi quase uma hora de caminhada, do 19ème ao 12ème, começando pela avenida Jean Jaurès e seguindo pelos bulevares de la Villette, de Belleville, de Ménilmontant, contornando o cemitério Père Lachaise, pegando a avenida Philippe Auguste até a Nation e o bulevard Diderot até a casa de Marta. Esse percurso me permitiu sentir com calma a mudança de atmosfera dos arrondissements parisienses.
As namoradas dos motociclistas: Ele fez toda uma imensa série, algumas bem trash
São justamente os bairros dos arrondissements do Norte e Nordeste da cidade que estão passando por um processo mais agudo de aburguesamento. Mas, sobretudo em Belleville, percebe-se uma dinâmica de mistura muito interessante, com várias etnias e classes sociais convivendo no mesmo espaço, o que é bastante saudável para o bairro. Ouve-se não apenas muitos idiomas distintos, mas sotaques também. Jovens turcos com gumex nos cabelos, à la juventude transviada; velhos muçulmanos magrebinos; chineses da nova e da velha diásporas; judeus ortodoxos; e os bobôs, cuja presença já começa a gerar mudanças nos bairros. Há muitos imóveis sendo reformados e novos tipos de lojas estão abrindo as portas nessas áreas, antes dominadas pelo comércio tradicional, do açougue kosher à lanchonete de kebab.
Nesses próximos dias vou apressar a pesquisa (de campo e na biblioteca), ajudar Marta num projeto de documentário interessantíssimo (detalhes no próximo post), visitar toda uma lista de pessoas e tomar um chope duas amigas que estão de passagem por Paris. Também quero ir ao maior número possível de exposições que conseguir. Prefiro ir a esses salões aqui em vez de ir ao cinema ou à boate, coisa que posso fazer no Brasil. As exposições aqui têm sido de altíssimo nível e, infelizmente, no Rio são poucos os lugares e poucas as exposições interessantes.
As capas das revistinhas de romances pornográficos vendidas nos anos 60 nos EUA. Richard Prince fez centenas delas
Outro dia, por exemplo, vi a exposição America, sobre Richard Prince, pintor e fotógrafo, na Biblioteca Mitterrand, um passeio pelo universo rebelde americano dos anos 50 para cá, passando pelos beats, o jornalismo gonzo, e a transa pornográfica dos romances pulp: motocicletas com louras peladas e seus namorados Hell’s Angels. Deu pra sentir? Na exposição estão, entre outros, Andy Warhol (como sempre), Velvet Underground, Hunter Thompson, todos os escritores beats, Bob Dylan e Jim Morrison. Muitas fotos de Woodstock e Hell’s Angels. Uma das coisas que mais me encantou foi uma carta amorosa de Jimi Hendrix para o pai, numa caligrafia que lembra seus solos de guitarra: redonda e bem desenhada.
Tenho a impressão, mas posso está falando besteira, que a turma beat bebeu na fonte dos escritores surrealistas franceses dos anos 20 e na geração posterior. Pelo menos na postura meio iconoclasta e rebelde. Penso em Leiris, Artaud, Bataille e Vian. Quer dizer, a coisa anarquista, surrealista, a psicanálise, a antropologia social e tal. Certamente, os litros e litros de bourbon, cigarro, drogas e a coisa junk pesada marcam uma postura (anti)social que se desdobra nas contestações que se seguem, do movimento hippie ao punk. Mas a parada americana é mais industrial.
Como não andei fotografando, aproveito para colocar fotos de Richard Prince tiradas da internet, como esse retrato do Jimi Hendrix
Isso me lembra um pouco o que me parece ser uma estratégia dos tropicalistas, que bebem na fonte de tudo o que é significativo e interessante, mesmo que esse tudo não siga na mesma direção. Às vezes, me parece que forçam uma certa barra nessas vinculações. Pelas entrevistas e depoimentos, vê-se, por exemplo, o movimento dos baianos abraçando a antropofagia de Oswald, a poesia concreta, a Bossa Nova, o Cinema Novo, o Teatro Oficina, a arquitetura de Niemeyer, o que tem lógica como influência. Mas não pára aí. O abraço tropicalista engloba ainda a poesia de João Cabral, o cinema marginal (que se opunha visceralmente ao cinema de Glauber e Nelson Pereira) e... tudo o que soma em termos de prestígio cultural. Fico na dúvida se, nessa geléia geral, estamos falando de influência ou de malandragem populista.
Paris, 2 junho 2011. Tenho passado os últimos dias num apartamento, cuja varanda dá para o canal de l’Ourc, no 19ème. Trata-se da casa do sociólogo Pedro García Sanchez e sua mulher, Hèlene, que viajaram e deixaram o apê comigo. Desse modo, dou uma folga para Ruben, Marta & Lorenzo (que teve provas essa semana) e também aproveito o silêncio e a solidão para avançar nas leituras, escrituras e organização dos dados de minha pesquisa. Tarefa hercúlea e cansativa, que exige muita concentração. Ontem, praticamente não pus os pés na rua, apesar do céu insuportavelmente azul e a temperatura agradável. Mas aproveitei para organizar a estrutura da monografia e já comecei a escrever a introdução, que é mais chatinha porque vou discutir uma série de conceitos e explicar minhas opções teóricas e metodológicas.
Hoje, em compensação, aproveitei o calor de 26 graus e caminhei daqui à casa de Marta e, depois, até o Marché d’Aligre, onde, quase desidratado, tomei uma cerveja no Penty. Não sei medir a distância, mas foi quase uma hora de caminhada, do 19ème ao 12ème, começando pela avenida Jean Jaurès e seguindo pelos bulevares de la Villette, de Belleville, de Ménilmontant, contornando o cemitério Père Lachaise, pegando a avenida Philippe Auguste até a Nation e o bulevard Diderot até a casa de Marta. Esse percurso me permitiu sentir com calma a mudança de atmosfera dos arrondissements parisienses.
As namoradas dos motociclistas: Ele fez toda uma imensa série, algumas bem trash
São justamente os bairros dos arrondissements do Norte e Nordeste da cidade que estão passando por um processo mais agudo de aburguesamento. Mas, sobretudo em Belleville, percebe-se uma dinâmica de mistura muito interessante, com várias etnias e classes sociais convivendo no mesmo espaço, o que é bastante saudável para o bairro. Ouve-se não apenas muitos idiomas distintos, mas sotaques também. Jovens turcos com gumex nos cabelos, à la juventude transviada; velhos muçulmanos magrebinos; chineses da nova e da velha diásporas; judeus ortodoxos; e os bobôs, cuja presença já começa a gerar mudanças nos bairros. Há muitos imóveis sendo reformados e novos tipos de lojas estão abrindo as portas nessas áreas, antes dominadas pelo comércio tradicional, do açougue kosher à lanchonete de kebab.
Nesses próximos dias vou apressar a pesquisa (de campo e na biblioteca), ajudar Marta num projeto de documentário interessantíssimo (detalhes no próximo post), visitar toda uma lista de pessoas e tomar um chope duas amigas que estão de passagem por Paris. Também quero ir ao maior número possível de exposições que conseguir. Prefiro ir a esses salões aqui em vez de ir ao cinema ou à boate, coisa que posso fazer no Brasil. As exposições aqui têm sido de altíssimo nível e, infelizmente, no Rio são poucos os lugares e poucas as exposições interessantes.
As capas das revistinhas de romances pornográficos vendidas nos anos 60 nos EUA. Richard Prince fez centenas delas
Outro dia, por exemplo, vi a exposição America, sobre Richard Prince, pintor e fotógrafo, na Biblioteca Mitterrand, um passeio pelo universo rebelde americano dos anos 50 para cá, passando pelos beats, o jornalismo gonzo, e a transa pornográfica dos romances pulp: motocicletas com louras peladas e seus namorados Hell’s Angels. Deu pra sentir? Na exposição estão, entre outros, Andy Warhol (como sempre), Velvet Underground, Hunter Thompson, todos os escritores beats, Bob Dylan e Jim Morrison. Muitas fotos de Woodstock e Hell’s Angels. Uma das coisas que mais me encantou foi uma carta amorosa de Jimi Hendrix para o pai, numa caligrafia que lembra seus solos de guitarra: redonda e bem desenhada.
Tenho a impressão, mas posso está falando besteira, que a turma beat bebeu na fonte dos escritores surrealistas franceses dos anos 20 e na geração posterior. Pelo menos na postura meio iconoclasta e rebelde. Penso em Leiris, Artaud, Bataille e Vian. Quer dizer, a coisa anarquista, surrealista, a psicanálise, a antropologia social e tal. Certamente, os litros e litros de bourbon, cigarro, drogas e a coisa junk pesada marcam uma postura (anti)social que se desdobra nas contestações que se seguem, do movimento hippie ao punk. Mas a parada americana é mais industrial.
Como não andei fotografando, aproveito para colocar fotos de Richard Prince tiradas da internet, como esse retrato do Jimi Hendrix
Isso me lembra um pouco o que me parece ser uma estratégia dos tropicalistas, que bebem na fonte de tudo o que é significativo e interessante, mesmo que esse tudo não siga na mesma direção. Às vezes, me parece que forçam uma certa barra nessas vinculações. Pelas entrevistas e depoimentos, vê-se, por exemplo, o movimento dos baianos abraçando a antropofagia de Oswald, a poesia concreta, a Bossa Nova, o Cinema Novo, o Teatro Oficina, a arquitetura de Niemeyer, o que tem lógica como influência. Mas não pára aí. O abraço tropicalista engloba ainda a poesia de João Cabral, o cinema marginal (que se opunha visceralmente ao cinema de Glauber e Nelson Pereira) e... tudo o que soma em termos de prestígio cultural. Fico na dúvida se, nessa geléia geral, estamos falando de influência ou de malandragem populista.
quarta-feira, 25 de maio de 2011
Bye bye Place d'Italie
Voilà, minha rua preferida do 13ème... pint a 3 eruos e azaração
Paris, 25 maio 2011. Desaparecido dessas páginas (páginas?), retorno com um breve resumo dos últimos dias, que não tiveram o esplendor dos demais, uma vez já estou completamente “naturalizado” nessa aldeia jacobina. Ontem, me mudei de volta para a casa de Marta & Ruben, depois de dois meses na casa de uma cantora brasileira, cujo nome vou omitir. Foi um período interessante e simultaneamente difícil. Interessante porque me permitiu perambular pela área da Place d’Italie, que me pareceu uma imensa Praça Serzedelo Correia (a nossa Praça dos Paraíbas) em formato de estrela. Ou seja, é uma mistura riquíssima de gente de tudo quanto é etnia, classe social, crença, cultura e nacionalidade. O pessoal mais endinheirado freqüenta os cafés, os restaurantes e o Shopping Italie 2, e a turma proletária, o McDonald’s e o KFC.
Mas, próximo dali, na já tão comentada neste diário de campo rue de Buttes-aux-Cailles, consigo beber uma pint cremosa por apenas 3 euros, se for antes das 20h. Isso no La folie en tête, meu boteco do coração naquelas imediações. Não se vêem muitos bobôs pela região da Place d’Italie e isso reforça, em mim, a sensação de Copacabana. Há nitidamente uma decadência e os grupos sociais que vivem no bairro me parecem muito bem assentados por lá. Mesmo na Butte-aux-Cailles, rua de azaração e boemia, é mais um tipo de boêmio que eu não classificaria como bobô, seja lá o que isso signifique. No La Folie, por exemplo, vejo sempre a mesma galera de habitués, muitos deles motociclistas, com sua jaquetas pretas à la Hell’s Angels e um ar de Les Loubards. Mas não vejo muitos bobôs, como no bairro d’Aligre. E isso é uma coisa interessante: o Penty é um pé-sujo se comparado ao La Folie, que tem uma ambiência rock’n’roll, mas o primeiro atrai mais bobôs que o segundo, devido à sua localização.
Motocicletas em frente ao pequenino e aconchegante La Folie en tête...
Porém, além dessas considerações sobre o bairro em si, estar na casa de uma cantora brasileira que fez muito sucesso aqui nos anos 70-80, lotando o Olympia de Paris e hoje amarga um esquecimento cruel, que praticamente implora por uma guigue em bistrôts obscuros, é duro. Sobretudo porque o apartamento, um conjunto do tipo BNH (que aqui é batizado com a sigla HLM) obrigava o uso compartilhado do banheiro e da cozinha, eu acabava meio que obrigado a interagir com ela e a compartilhar seu processo depressivo, expresso pelos cigarros fumados um após o outro, na cama, diante da TV, sintonizada naqueles programas de auditório franceses extremamente cafonas ou em seriados americanos, com Law & Order, dublados em francês.
Assim, dormir nessa casa trazia um certo peso para mim. De modo que, mal acordava, tomava banho e me mandava, muitas vezes, antes de minha anfitriã acordar. E só voltava no fim do dia, início da madrugada, quando a encontrava acordada, fumando e vendo TV. Para ela, eu acho, fui uma espécie de fantasma, que, de vez em quando, aparecia para assombrar. Isso tudo é o preço de não ter me organizado suficientemente cedo com relação à hospedagem. Paris é uma cidade com uma grande crise habitacional, por falta de moradia disponível. É impossível alugar qualquer coisa por mês. Só há imóvel no esquema de temporada para turista, quando cobram uma fortuna por semana. Eu paguei 450 euros por mês e todos me disseram que foi caro, mas não encontrei qualquer alternativa.
Bem, mas já era. Agora volto a perturbar Marta, Ruben e Lorenzo por mais um mês, antes de voltar para o Brasil. Aqui, além da companhia maravilhosa, estou à côte da Place d’Aligre, o que me permite ir a pé ao meu terrain de pesquisa. Na próxima semana, me mudo para a casa de um sociólogo, que vai viajar por uma semana e deixou o apartamento dele comigo. Aproveito para receber uma amiga que chega do Brasil.
Stencil é uma das técnicas preferidas pelos grafiteiros de Paris. Esse está na área da Place d'Italie, perto do Chinatown
Quanto à pesquisa, as coisas avançam no ritmo de uma etnografia, ou seja, no ritmo do dia-a-dia. Observar o cotidiano é uma tarefa que exige paciência e sensibilidade. Algo muito distinto do jornalismo, que está sempre em busca de algo extraordinário, a maioria das vezes apressadamente. Mesmo assim, com o tempo muito escasso, consegui reunir bastante dados, inclusive fotográficos e, com o Ruben, estou fazendo um registro em vídeo da pesquisa. Ainda faltam algumas imagens, entrevistas e, principalmente, muita leitura sobre o tema da gentrification. Mas, o texto da monografia, que recupera meu campo em Botafogo para fazer uma comparação com o bairro d’Aligre, já está sendo produzido.
E hoje, para não perder a mania, vi quatro documentários etnográficos sobre rituais de identidade, iniciação e purificação (Madagascar, Cuba, e dois da Costa do Marfim), a convite de Brice. Paris fez quase 30 graus, o céu estava insuportavelmente azul (que vontade de ir à praia) e a luz, cristalina À bientôt!
Paris, 25 maio 2011. Desaparecido dessas páginas (páginas?), retorno com um breve resumo dos últimos dias, que não tiveram o esplendor dos demais, uma vez já estou completamente “naturalizado” nessa aldeia jacobina. Ontem, me mudei de volta para a casa de Marta & Ruben, depois de dois meses na casa de uma cantora brasileira, cujo nome vou omitir. Foi um período interessante e simultaneamente difícil. Interessante porque me permitiu perambular pela área da Place d’Italie, que me pareceu uma imensa Praça Serzedelo Correia (a nossa Praça dos Paraíbas) em formato de estrela. Ou seja, é uma mistura riquíssima de gente de tudo quanto é etnia, classe social, crença, cultura e nacionalidade. O pessoal mais endinheirado freqüenta os cafés, os restaurantes e o Shopping Italie 2, e a turma proletária, o McDonald’s e o KFC.
Mas, próximo dali, na já tão comentada neste diário de campo rue de Buttes-aux-Cailles, consigo beber uma pint cremosa por apenas 3 euros, se for antes das 20h. Isso no La folie en tête, meu boteco do coração naquelas imediações. Não se vêem muitos bobôs pela região da Place d’Italie e isso reforça, em mim, a sensação de Copacabana. Há nitidamente uma decadência e os grupos sociais que vivem no bairro me parecem muito bem assentados por lá. Mesmo na Butte-aux-Cailles, rua de azaração e boemia, é mais um tipo de boêmio que eu não classificaria como bobô, seja lá o que isso signifique. No La Folie, por exemplo, vejo sempre a mesma galera de habitués, muitos deles motociclistas, com sua jaquetas pretas à la Hell’s Angels e um ar de Les Loubards. Mas não vejo muitos bobôs, como no bairro d’Aligre. E isso é uma coisa interessante: o Penty é um pé-sujo se comparado ao La Folie, que tem uma ambiência rock’n’roll, mas o primeiro atrai mais bobôs que o segundo, devido à sua localização.
Motocicletas em frente ao pequenino e aconchegante La Folie en tête...
Porém, além dessas considerações sobre o bairro em si, estar na casa de uma cantora brasileira que fez muito sucesso aqui nos anos 70-80, lotando o Olympia de Paris e hoje amarga um esquecimento cruel, que praticamente implora por uma guigue em bistrôts obscuros, é duro. Sobretudo porque o apartamento, um conjunto do tipo BNH (que aqui é batizado com a sigla HLM) obrigava o uso compartilhado do banheiro e da cozinha, eu acabava meio que obrigado a interagir com ela e a compartilhar seu processo depressivo, expresso pelos cigarros fumados um após o outro, na cama, diante da TV, sintonizada naqueles programas de auditório franceses extremamente cafonas ou em seriados americanos, com Law & Order, dublados em francês.
Assim, dormir nessa casa trazia um certo peso para mim. De modo que, mal acordava, tomava banho e me mandava, muitas vezes, antes de minha anfitriã acordar. E só voltava no fim do dia, início da madrugada, quando a encontrava acordada, fumando e vendo TV. Para ela, eu acho, fui uma espécie de fantasma, que, de vez em quando, aparecia para assombrar. Isso tudo é o preço de não ter me organizado suficientemente cedo com relação à hospedagem. Paris é uma cidade com uma grande crise habitacional, por falta de moradia disponível. É impossível alugar qualquer coisa por mês. Só há imóvel no esquema de temporada para turista, quando cobram uma fortuna por semana. Eu paguei 450 euros por mês e todos me disseram que foi caro, mas não encontrei qualquer alternativa.
Bem, mas já era. Agora volto a perturbar Marta, Ruben e Lorenzo por mais um mês, antes de voltar para o Brasil. Aqui, além da companhia maravilhosa, estou à côte da Place d’Aligre, o que me permite ir a pé ao meu terrain de pesquisa. Na próxima semana, me mudo para a casa de um sociólogo, que vai viajar por uma semana e deixou o apartamento dele comigo. Aproveito para receber uma amiga que chega do Brasil.
Stencil é uma das técnicas preferidas pelos grafiteiros de Paris. Esse está na área da Place d'Italie, perto do Chinatown
Quanto à pesquisa, as coisas avançam no ritmo de uma etnografia, ou seja, no ritmo do dia-a-dia. Observar o cotidiano é uma tarefa que exige paciência e sensibilidade. Algo muito distinto do jornalismo, que está sempre em busca de algo extraordinário, a maioria das vezes apressadamente. Mesmo assim, com o tempo muito escasso, consegui reunir bastante dados, inclusive fotográficos e, com o Ruben, estou fazendo um registro em vídeo da pesquisa. Ainda faltam algumas imagens, entrevistas e, principalmente, muita leitura sobre o tema da gentrification. Mas, o texto da monografia, que recupera meu campo em Botafogo para fazer uma comparação com o bairro d’Aligre, já está sendo produzido.
E hoje, para não perder a mania, vi quatro documentários etnográficos sobre rituais de identidade, iniciação e purificação (Madagascar, Cuba, e dois da Costa do Marfim), a convite de Brice. Paris fez quase 30 graus, o céu estava insuportavelmente azul (que vontade de ir à praia) e a luz, cristalina À bientôt!
sexta-feira, 20 de maio de 2011
Uma volta por Belleville
Paris, 20 maio 2011. Ontem fiz um parcour commenté no Belleville, guiado por meu amigo Augustin Geoltrain, morador do bairro desde a pré-história. Na verdade, conheci seu apartamento no número 30 da rue Belleville, e demos uma volta no quarteirão e isso foi suficiente para ver a problemática do bairro e o acerto de minha decisão de focar minha pesquisa sobre o quartier d’Aligre, que não só se apresenta como um caso mais favorável à comparação com o processo de gentrification em Botafogo, como também não passa por outros fenômenos sociais como Belleville, o que complexificaria muito a pesquisa.
Começamos nosso tour pelo quarteirão pela rue de Belleville, totalmente transformada em chinatown, com uma presença chinesa ainda mais conspícua do que na Place d’Italie, o reduto tradicional dos asiáticos em Paris. Augustin reclamou muito do uso das calçadas pelos chineses, bloqueando a passagem para descarregar suas mercadorias e uma ocupação que ignora a convivialidade com os demais residentes do bairro. Sob seu prédio está a livraria de Xavier, a quem fui apresentado, e se mostrou uma pessoa bem amável (que tentação, entrar ali).
Entramos em seguida na rue de Tourtille e, depois, na rue Lesage, onde encontramos vários moradores antigos, conhecidos de Augustin, inclusive Edouard, que parece um personagem da Nouvelle Vague. Falamos com todos e ele me apresentou como un chercheur brésilien, étudient du professeur Mello, que todos conhecem muito bem. Esse pedaço está todo sendo renovado e ocupado por bobôs, a quem os moradores antigo vêem com olhos desconfiados. Segundo Augustin, a mulher que comprou seu antigo apartamento, no número 10 da rue Lesage, sequer lhe dá bom dia, quando cruzam pelas ruas do bairro. Ali também há uma forte comunidade judaica, com sinagoga e açougues kosher.
Em seguida, entramos na rue Ramponeau e tudo se transformou. Foi a mesma sensação que tinha em Nova York, quando, ao dobrar uma esquina, entrava em outro espaço físico e moral, como do Chinatown para o Little Italy. A mudança é visível e nos bate na cara. A rue Ramponeau, nesse trecho, é uma pequena África. É lá que fica o Foyer Africaine e a imagem é de cinema, com grupo de jovens ouvindo rap e passando o dia na rua. Há tráfico de drogas e essa é uma das poucas áreas de Paris que, para fotografar, tem tomar cuidado. Mais acima, em outra quadra, há prostituição de chinesas de meia idade. Mas, ao mesmo tempo, é muito tranqüilo passar por lá. Ninguém te aborda ou mexe com você. Me lembrou a Lapa.
Mais adiante, entramos na rue Dénoyez, uma rua cheia de pequenos ateliês e cafés, com todos os imóveis grafitados. A sensação é que entramos numa grande história em quadrinhos. Ali também fica a piscina pública e academia, uma belíssima idéia, que alguns rejeitam, pois não conseguem conceber tantas tribos distintas compartilhando a mesma água.
Por fim terminamos no bistrot Au Vieux Saumur, onde eu matei duas Leffes, para não perder a mania e jogamos fora uma boa meia hora de conversa fiada. Esse bistrot fica ao lado de outro que já tinha ido com Marta também muito bom, chamado Les Folies (adoraria fazer um Paris Botequim). Bem, fiquei de voltar lá com outra pesquisadora, Laura Graziela, e dessa vez com câmera. Fico devendo fotos de Belleville, mas aproveito para publicar outras do bairro, que fiz em outra parte (o bairro é imenso). À bientôt!
segunda-feira, 16 de maio de 2011
Fête de la trôle
A fanfarra só de mulheres, quebrando tudo no churrasco comunitário
Paris, 16 maio 2011. A ausência dos últimos dias decorreu de vários compromissos acadêmicos e de minha pesquisa, que exigiram minha total concentração. Na última quinta-feira, dia 12, apresentei um seminário na Universidade de Paris Ouest — Nanterre, a convite do Departamento de Sociologia, e seu curso de mestrado Economie et sociétés — Mutations des sociétés contemporaines. Esse laboratório tem um curso de mestrado intitulado Socio-anthropologie de l’Amérique Latine, que é coordenado pelos professores Pedro José Garcia Sanchez (um venezuelano radicado na França) e Sylvie Pedron-Colombani. Foi para os alunos de Pedro que fiz uma apresentação.
A encenação na Place d'Aligre: Comuna de Paris para cerca de 400 pessoas
O problema é que ele preferiu, pelos temas que vem tratando em seu curso, que eu falasse sobre minha tese, em que me debrucei sobre o ofício do jornalista contemporâneo, focando nos ritos de interação social no ambiente de trabalho, para tentar vislumbrar o rumo desse ofício que passa por uma verdadeira revolução. O título do seminário acabou ficando pomposo demais, mas vá lá, o assunto merece: Les défis contemporains de l’enquête et de l’information: entre le journalisme et l’anthropologie ou Le journalisme à la époque de sa réprodution numérique.
O rango comunitário da Commune Libre d'Aligre: barbecue e cerveja
Eu, que tenho um problema genético de timidez aguda, sempre sofri para fazer meus seminários, palestras e aulas no Brasil, na França então... outro país, outro idioma... Os elementos que pesavam sobre minha timidez foram tantos, que acabei relaxando e fiz uma boa apresentação de duas horas, com mais meia hora de debate. No fim, saí aliviado e feliz por ter passado por mais esse teste. Antes de iniciar essa viagem, esse era um dos grandes fantasmas que rondavam meu espírito. Mas o melhor teria sido debater com os alunos o processo de gentrification no Rio e em Paris, tema de meu pós-doc.
Cartazes convocando para os eventos da Fête de la trôle
A segunda banda pôs o pessoal para dançar
Feito esse parêntesis, digamos, epistemológico, após a experiência do seminário, voltei para minha etnografia, razão desse séjour em Paris. Passei os últimos dias mergulhado no bairro d’Aligre, acompanhando uma série de eventos, alguns cotidianos outros excepcionais, como a fête de la trole, promovida pela Commune Libre d’Aligre, englobando a sexta-feira e o sábado passados.
O pessoal caiu dentro do churrasco: integração comunitária pelo estômago
Na sexta, teve uma encenação teatral sobre a Comuna de Paris, que está completando 140 anos, e representa o espírito que a Commune Libre d’Aligre pretende para o bairro: uma relação independente em relação à Prefeitura, um domínio dos comitês e associações sobre a vida comunitária dos bairros, tudo isso com um caráter socialista e mesmo anarquista. A encenação foi realizada na Place d’Aligre, que é o coração do bairro, e terminou com as cerca de 400 pessoas presentes cantando a Internacional, algumas com a mão no coração. Voilà, esse é o espírito que norteia não só a associação, mas um tipo de francês consciente, com mais de 40 anos, de origem operária que vive no quartier.
O pessoal contribui com uns trocadinhos (que não dão para nada)...
O trio americano tocando blues do Mississippi no dia principal do mercado
A peça, muito bem encenada, com atores profissionais, que montaram um cenário na praça e aproveitaram um longo poema sobre os eventos históricos da Comuna de Paris como guia da encenação. À medida que iam recitando suas falas, o público reagia, vaiando os representantes do governo e aplaudindo os revoltosos. Uma coisa inocente e ingênua, quase mesmo pueril, mas mesmo assim emocionante, sobretudo nesses dias de niilismo e fragmentação. No fim, ajudei o pessoal a desmontar e recolher as cadeiras espalhadas pela praça e conversei com Cécile, uma das líderes da Commune Libre d’Aligre. Ela me disse que muitos dos jovens franceses desconhecem os eventos da Comuna, numa total alienação.
No mercado fechado também tem música...
... e, do lado de fora, o homem africano faz malabarismo...
... e o pessoal passa o abaixo-assinado pelo direito a voto para os estrangeiros
De minha parte, aproveitei para indagar por que os residentes do bairro de origem magrebina não participavam dos eventos da associação. Ela me disse que já fizeram de tudo para atraí-los para as atividades comunitárias, mas eles permanecem fechados entre eles. Nem mesmo as refeições comunitárias gratuitas ou eventos preparados especialmente para eles, como projeção de filmes sobre cultura árabe ou muçulmana conseguiu animá-los. Com a geração mais nova, eles conseguiram, pelo menos, criar um vínculo de trabalho. Eles contratam os jovens para ajudar na preparação de eventos e pagam. Nessa relação de biscate, o pessoal aparece, faz as coisas (tipo montar palcos etc.), mas não se liga no conteúdo dos eventos. Apenas trabalham em vão embora, assim que são pagos.
Panfletos da Commune Libre d'Aligre à disposição no dia da festa
A geração mais velha — a maioria deles residente no Foyer dos trabalhadores à rue Beccaria — forma um grupo muito unido e solitário. Eles trabalharam uns 35 ou 40 anos, enviando dinheiro para seus familiares que ficaram nos países de origem, Tunísia, Argélia, Marrocos e tal. Com o tempo, acabaram perdendo o vínculo com as gerações mais novas de sua própria família, inclusive filhos, a quem raramente viam. Na aposentadoria, tendo os direitos de residência reconhecidos na França, optaram por viver aqui, onde não são reconhecidos como franceses, mas pelo menos têm seus amigos, em situação similar.
Detalhe do jardim comunitário Aligresse
Todos os dias, eles se vestem com apuro, colocando terno, e vão para o mercado, para a praça ou os cafés das imediações, onde se encontram e conversam. Eles formam um grupo muito peculiar, que se destaca visualmente dos bobôs e mesmo dos antigos moradores do bairro. Cada um deles tem histórias de vida incríveis, que dariam para horas e horas de boa prosa. Mas o problema é que muitos falam o idioma precariamente, a maioria não é alfabetizada (não sabe escrever) em francês, limitando-se ao vocabulário do cotidiano. Sua conversa é mesmo em árabe.
Eu e Sandrine no Penty... conversa de botequim
No sábado, a festa prosseguiu. Um churrasco ao lado do jardim comunitário do bairro, abriu os eventos do dia. O jardim, o Aligresse, merece também uma explicação. Era uma área abandonada, com imóveis precários e já meio desabando, que a prefeitura pretendia renovar e passar à iniciativa privada. Os moradores se organizaram e conseguiram transformar uma parte da área em um conjunto habitacional popular, que aqui chamam de HLM, mas sofisticado, com apartamentos muito bem equipados e serviço básico de altíssima qualidade (nada a ver com os condomínios da época de Lacerda de que vem falando Rogerinho Daflon em sua excelente série de reportagens no Globo). Numa outra parte do terreno, os moradores conseguiram fazer um parquinho e o jardim comunitário, onde todos participam, plantando e cuidando.
O churrasco do sábado teve direito à fanfarra e muita animação. A banda formada só por mulheres tocou o rebu. Depois, outra banda, essa mista, assumiu a programação. Gostei muito dos arranjos que incluíam desde clássicos como Besame mucho a riffs de reggae bem dançantes. Me lembrou o trabalho que o pessoal dos tambores de Candombe fazem em Botafogo (saudades de Joana). Teve ainda atividades para crianças, exposições, ateliês de portas abertas na vizinhança e um jantar comunitário. A maioria dos participantes eram moradores antigos de classe média ou bobôs recém-chegados ao bairro.
Gosto dessa foto porque mostra o Penty na esquina, o prédio ao lado, que está sendo reformado e vai se tornar num empreendimento bobô, e a velhinha atravessando a rua, molhada pela passagem pelo caminhão lava-ruas da prefeitura
Entre esses eventos, aproveitei sempre para passar no Penty e fazer anotações. Acho que consegui cobrir todo o horário de funcionamento do café, anotando os tipos de clientes que variam segundo o horário e os dias. Tudo isso fotografado e anotado. Até fiz uma amizade com uma freguesa, chamada Sandrine, que me viu escrevendo no caderno de campo e ficou curiosa.
Augustin e sua amiga, Martine, no Penty
Ontem, no domingo, fiz minha visita habitual ao mercado. Reparei que os músicos começam a invadir a região. Do realejo ao trio de blues americano, passando pelo sanfoneiro solitário, que toca sempre a mesma canção (o que funciona como um aviso de sua presença nas imediações), há cada vez mais manifestações artísticas, à medida que o tempo se firma e a temperatura oscila agradavelmente entre 15 e 20 graus, sem chuva. Há também muita panfletagem sobre os temas mais variados, da luta contra a instalação de câmera de vigilância (ao contrário do Rio, onde os moradores clamam por elas), ao abaixo-assinado pedindo direito de voto para os estrangeiros que vivem e trabalham na França.
No Penty, aproveitei o domingo para tomar um chope com meu amigo Augustin Geoltrain, que me falou extensamente sobre Belleville, este sim um quartier que merece uma extensa pesquisa (e que vem sendo etnografado com competência pelo pessoal do Laboratório de Etnografia Metropolitana, do IFCS-UFRJ), tanto são os fenômenos sociais que se manifestam no lugar de uma ponta a outra. Foram horas de boa conversa com ele, que tem uma percepção e sensibilidade agudíssimas, além de um excelente bom humor. Agora que estou nos últimos 30 e poucos dias antes de meu regresso, quero me concentrar mais ainda nas leituras e no trabalho de campo no bairro. A bientôt.
segunda-feira, 9 de maio de 2011
Diretamente do Penty
A fachada do Penty, um boteco de esquina no bairro d'Aligre
Paris, 9 maio 2011. Escrevo estas linhas do Penty, no coração do bairro d’Aligre, em Paris. É engraçado que o Penty, um pé-sujo que reúne bobôs e moradores mais antigos, de origem mais modesta do ponto de vista aquisitivo, ofereça aos seus clientes um serviço de Wi-Fi, ao passo que o todo modernoso Café de l’Industrie, não. Estou sentado na parte interna, sorvendo uma Leffe, enquanto digito essas linhas na mesinha do canto. Só não fiz fotos porque estou sem o aparelho que copia da câmera para o computador, do contrário, este seria um post quase ao vivo. De qualquer modo, como tenho fotos do Penty e dos arredores de ontem e outros dias, aproveito para fazer um post breve, enquanto a bateria do laptop resiste.
Hoje, uma segunda-feira, dia que o mercado d’Aligre fecha, o bairro está bem calmo, sem sinais da efervescência de ontem e de sábado, quando tudo por aqui fervilhou. Mesmo assim, o Penty está relativamente cheio, com todas as mesinhas do exterior ocupadas e só o salão interno vazio (onde estou). O véu anuncia uma chuva, mas a temperatura continua em torno dos 26 graus, de modo que os parisienses aproveita o calor para ficar do lado de fora. Os bares fechados sofrem nessa época. Mesmo os mais badalados ficam vazios, com o pessoal preferindo termo-regular ao sol, nas esquinas e terrasses, desfrutando da rara luz que o calor traz.
O Penty visto do meu ponto de vista, na mesinha do canto, dentro do salão
Para mim, no entanto, a parte interna do Penty é importante, pois é onde os fregueses assíduos preferem ficar, faça frio ou calor. Com as barrigas encostadas ao balcão de madeira, eles jogam conversa fora com quem estiver gerenciando o bar. Normalmente é o Jojo, mas hoje ele não está por aqui. Seu irmão, Hervé, toca o bar, com a ajuda de Berenger, sua sobrinha ou filha, ainda não descobri.
Além disso, o Penty tem a cerveja mais barata do bairro e ainda oferece pequenos porções de batatas e cenouras calabresa, amendoins e azeitonas pretas. De graça. E o patron é um judeu tunisiano, o que serve para desconstruir o estereótipo de que os judeus são sovinas. Não conheço, entre meus queridos amigos donos de botequim no Rio, ninguém que ofereça petiscos de graça e chope abaixo da concorrência. Aliás, pensando bem, todos meus amigos judeus, e são muitos, são em geral extremamente generosos. Penso sobretudo em Tito, Mila e Marcelok.
Além disso, como não tenho um lugar tranqüilo para escrever e ler, o que tem sido um problema para minha pesquisa, descobrir que o Penty tem Wi-Fi é uma boa notícia. Aqui passo um bom tempo reunindo minhas notas e observando o bairro, e agora sei que posso já colocar na rede, in loco.
Enquanto isso, as pessoas a minha volta tratam de seus assuntos. O bar na França se presta muito aos projetos tanto quanto ao lazer. Tem gente que traz seus livros, cadernos e laptops e ficam horas, com uma xícara de café, trabalhando. Outros fazem reuniões importantes, para discutir projetos, eventos etc. Na parte interna, tem um sujeito careca e barbudo, que vem sempre com seu imenso cachorro. O animal se deitou no chão, à espera dos carinhos que os fregueses, normalmente mulheres, lhe fazem na barriga. Quase uma indecência. Ao mesmo tempo, entra uma mamãe com seu bebê num carrinho. Ela sorve seu chope (um Amstel) tranquilamente, com o bebê no colo. Enfim, tem cerca de sete ou oito pessoas aqui dentro e todas se conhecem e parecem morar nas imediações. E assim é o Penty, no cair da tarde, entrando no happy hour. Um bar família.
Berenger e Jojo, alma do Penty
Estou aproveitando essa viagem para tomar nota de alguns cafés e bistrots que me chamaram a atenção. No meu blog Pendura Essa vou fazer uma avaliação mais detalhada sobre esse bares. Me aguardem. Agora, me dêem licença que o dia foi de muita pesquisa e leitura e, agora, quero aproveitar meu happy hour, antes de me recolher. À bientôt!
Paris, 9 maio 2011. Escrevo estas linhas do Penty, no coração do bairro d’Aligre, em Paris. É engraçado que o Penty, um pé-sujo que reúne bobôs e moradores mais antigos, de origem mais modesta do ponto de vista aquisitivo, ofereça aos seus clientes um serviço de Wi-Fi, ao passo que o todo modernoso Café de l’Industrie, não. Estou sentado na parte interna, sorvendo uma Leffe, enquanto digito essas linhas na mesinha do canto. Só não fiz fotos porque estou sem o aparelho que copia da câmera para o computador, do contrário, este seria um post quase ao vivo. De qualquer modo, como tenho fotos do Penty e dos arredores de ontem e outros dias, aproveito para fazer um post breve, enquanto a bateria do laptop resiste.
Hoje, uma segunda-feira, dia que o mercado d’Aligre fecha, o bairro está bem calmo, sem sinais da efervescência de ontem e de sábado, quando tudo por aqui fervilhou. Mesmo assim, o Penty está relativamente cheio, com todas as mesinhas do exterior ocupadas e só o salão interno vazio (onde estou). O véu anuncia uma chuva, mas a temperatura continua em torno dos 26 graus, de modo que os parisienses aproveita o calor para ficar do lado de fora. Os bares fechados sofrem nessa época. Mesmo os mais badalados ficam vazios, com o pessoal preferindo termo-regular ao sol, nas esquinas e terrasses, desfrutando da rara luz que o calor traz.
O Penty visto do meu ponto de vista, na mesinha do canto, dentro do salão
Para mim, no entanto, a parte interna do Penty é importante, pois é onde os fregueses assíduos preferem ficar, faça frio ou calor. Com as barrigas encostadas ao balcão de madeira, eles jogam conversa fora com quem estiver gerenciando o bar. Normalmente é o Jojo, mas hoje ele não está por aqui. Seu irmão, Hervé, toca o bar, com a ajuda de Berenger, sua sobrinha ou filha, ainda não descobri.
Além disso, o Penty tem a cerveja mais barata do bairro e ainda oferece pequenos porções de batatas e cenouras calabresa, amendoins e azeitonas pretas. De graça. E o patron é um judeu tunisiano, o que serve para desconstruir o estereótipo de que os judeus são sovinas. Não conheço, entre meus queridos amigos donos de botequim no Rio, ninguém que ofereça petiscos de graça e chope abaixo da concorrência. Aliás, pensando bem, todos meus amigos judeus, e são muitos, são em geral extremamente generosos. Penso sobretudo em Tito, Mila e Marcelok.
Além disso, como não tenho um lugar tranqüilo para escrever e ler, o que tem sido um problema para minha pesquisa, descobrir que o Penty tem Wi-Fi é uma boa notícia. Aqui passo um bom tempo reunindo minhas notas e observando o bairro, e agora sei que posso já colocar na rede, in loco.
Enquanto isso, as pessoas a minha volta tratam de seus assuntos. O bar na França se presta muito aos projetos tanto quanto ao lazer. Tem gente que traz seus livros, cadernos e laptops e ficam horas, com uma xícara de café, trabalhando. Outros fazem reuniões importantes, para discutir projetos, eventos etc. Na parte interna, tem um sujeito careca e barbudo, que vem sempre com seu imenso cachorro. O animal se deitou no chão, à espera dos carinhos que os fregueses, normalmente mulheres, lhe fazem na barriga. Quase uma indecência. Ao mesmo tempo, entra uma mamãe com seu bebê num carrinho. Ela sorve seu chope (um Amstel) tranquilamente, com o bebê no colo. Enfim, tem cerca de sete ou oito pessoas aqui dentro e todas se conhecem e parecem morar nas imediações. E assim é o Penty, no cair da tarde, entrando no happy hour. Um bar família.
Berenger e Jojo, alma do Penty
Estou aproveitando essa viagem para tomar nota de alguns cafés e bistrots que me chamaram a atenção. No meu blog Pendura Essa vou fazer uma avaliação mais detalhada sobre esse bares. Me aguardem. Agora, me dêem licença que o dia foi de muita pesquisa e leitura e, agora, quero aproveitar meu happy hour, antes de me recolher. À bientôt!
domingo, 8 de maio de 2011
Le nouvel esprit révolutionnaire
A galera reunida na escadaria de l'Opéra da Bastille em defesa da descriminalização da maconha
Paris, 7 maio 2011. Depois de um desencontro com Bia Caiado no l'Opéra da Bastille, vim para o Café de l’Industrie, onde escrevo estas linhas. Tant pis. Enquanto esperava por ela, me vi no coração da manifestação mundial a favor da descriminalização da Cannabis. Havia várias tribos, desde adolescentes punks, com piercings em lugares improváveis e tattoos de significado obscuro, a coroas ripongas, que me lembravam o Gabeira. Também estavam lá manifestantes de vários organizações de esquerda, panfletando suas mensagens emancipadoras. Gays, rastafáris, blacks e até mesmo franceses convencionais, seja lá o que isso significa.
Fez um sol tão magnífico, que cheguei a sentir o cheiro de maresia, ficando com a impressão de que se dobrasse a esquina da Faubourg Saint-Antoine, chegaria à praia de Ipanema. Não que eu seja um freqüentador assíduo quando estou no Rio. Normalmente tenho muita preguiça para chegar ao mar, mas o fato de saber que ele está lá, ao alcance da minha vontade, me tranqüiliza o espírito. Aqui, no máximo, é o rio Sena, que o pessoal do 5 x UPP batizou de “valão”. Na Place d’Italie (que é uma espécie de Copacabana) estou do lado gauche do “valão”, muito aquém do mar carioca. Por isso, o sol na Bastille me trouxe o cheiro de maresia, turbinado por uma saudade difusa e primitiva, quase inconsciente.
A manifestação, que não recebeu autorização da polícia, teve um tour de bicicleta pela cidade
Entre os vários grupos que panfletavam na marcha pela maconha, um deles, chamado Libéraux de Gauche (mais informações no site www.libgauche.fr) , critica o dirigismo e o estatismo do marxismo clássico, visto por eles como um desvio ideológico em relação à verdadeira noção de “esquerda”, um movimento voltado à emancipação do homem e da mulher. Isso me fez pensar no livro de Boltanski e Chiapello, e a análise sociológica que fazem disso que eles denominam o novo espírito do capitalismo.
O estágio atual do capitalismo, caracterizado pelo neoliberalismo e a globalização, dizem os autores, gerou uma situação paradoxal, em que as empresas e bancos vão muito bem, apesar da crise, e as pessoas, nem tanto. Eles afirmam, ademais, que apesar desse desenvolvimento perverso do ponto de vista humanista, a crítica acadêmica e filosófica, assim como das organizações políticas de esquerda, não produziram uma análise consistente desse fenômeno, que pudesse gerar uma crítica e um programa de resistência ou uma alternativa.
Sábado de sol, perfeito para um protesto de bicicleta, já que não há praia por aqui
Não sei nada sobre esse movimento Libéraux de Gauche, que tem certamente um matiz anarquista. Mas acho muito interessante, como fenômeno social, que tenham surgido nos últimos anos uma miríade de organizações políticas à esquerda, para confrontar o capitalismo neoliberal. Elas trazem como bandeira não apenas a emancipação da classe trabalhadora, mas defendem uma idéia de liberdade e hedonismo, na qual se encaixa muito bem a descriminalização da maconha, direitos civis para gays, luta contra o racismo e discriminações sociais. Me lembrei de um jornalzinho trotkista, dos anos 80, chamado Luta & Prazer, que seguia nessa linha mais ampla de luta. Um outro mundo é possível.
O Café de l'Industrie, meu refúgio, quando estou pela Bastille
Muitos dos bobôs que chegam a Botafogo e ao Marché d’Aligre têm essa mentalidade de esquerda, o que torna o processo de gentrification, a partir de sua presença no bairro, um tanto paradoxal. Bem, em Botafogo, há um processo mais explícito de aburguesamento, com os novos condomínios exclusivos e que se isolam da rua. Aqui, os novos moradores — intelectuais, profissionais liberais, artistas, entre outros —, vêm para a região d’Aligre em busca de uma vida mais “autêntica”, algo que se enquadra muito bem na ampla lista de reivindicações da “nova esquerda”. Mas seus hábitos continuam sendo o de uma classe média instruída e com poder aquisitivo razoável. Por meio, sobretudo, do consumo, atraem novos serviços e produção de bens, pressionam os preços da habitação e, sem querer, acabam fagocitando a região, que se transforma definitivamente.
A garçonete do l'Industrie e suas curvas revolucionárias
Bem, enquanto vou refletindo sobre isso, neste sábado de sol e calor parisiense, eis que a garçonete do l’Industrie chega com meu confit de canard, meu prato predileto neste café. Sorvo minha Leffe e observo os movimentos graciosos da serveuse, que anda para lá e para cá, numa coreografia sensual e simpática, desfrutando de seu vestido de verão parisiense (hoje fez mais calor aqui do que no Rio). Seja qual for o sentido de mudança política, em nome de uma justiça social e um humanismo mais solidário, é essa menina, no fim das contas, que desperta o meu mais profundo e íntimo sentido revolucionário. À bientôt!
Paris, 7 maio 2011. Depois de um desencontro com Bia Caiado no l'Opéra da Bastille, vim para o Café de l’Industrie, onde escrevo estas linhas. Tant pis. Enquanto esperava por ela, me vi no coração da manifestação mundial a favor da descriminalização da Cannabis. Havia várias tribos, desde adolescentes punks, com piercings em lugares improváveis e tattoos de significado obscuro, a coroas ripongas, que me lembravam o Gabeira. Também estavam lá manifestantes de vários organizações de esquerda, panfletando suas mensagens emancipadoras. Gays, rastafáris, blacks e até mesmo franceses convencionais, seja lá o que isso significa.
Fez um sol tão magnífico, que cheguei a sentir o cheiro de maresia, ficando com a impressão de que se dobrasse a esquina da Faubourg Saint-Antoine, chegaria à praia de Ipanema. Não que eu seja um freqüentador assíduo quando estou no Rio. Normalmente tenho muita preguiça para chegar ao mar, mas o fato de saber que ele está lá, ao alcance da minha vontade, me tranqüiliza o espírito. Aqui, no máximo, é o rio Sena, que o pessoal do 5 x UPP batizou de “valão”. Na Place d’Italie (que é uma espécie de Copacabana) estou do lado gauche do “valão”, muito aquém do mar carioca. Por isso, o sol na Bastille me trouxe o cheiro de maresia, turbinado por uma saudade difusa e primitiva, quase inconsciente.
A manifestação, que não recebeu autorização da polícia, teve um tour de bicicleta pela cidade
Entre os vários grupos que panfletavam na marcha pela maconha, um deles, chamado Libéraux de Gauche (mais informações no site www.libgauche.fr) , critica o dirigismo e o estatismo do marxismo clássico, visto por eles como um desvio ideológico em relação à verdadeira noção de “esquerda”, um movimento voltado à emancipação do homem e da mulher. Isso me fez pensar no livro de Boltanski e Chiapello, e a análise sociológica que fazem disso que eles denominam o novo espírito do capitalismo.
O estágio atual do capitalismo, caracterizado pelo neoliberalismo e a globalização, dizem os autores, gerou uma situação paradoxal, em que as empresas e bancos vão muito bem, apesar da crise, e as pessoas, nem tanto. Eles afirmam, ademais, que apesar desse desenvolvimento perverso do ponto de vista humanista, a crítica acadêmica e filosófica, assim como das organizações políticas de esquerda, não produziram uma análise consistente desse fenômeno, que pudesse gerar uma crítica e um programa de resistência ou uma alternativa.
Sábado de sol, perfeito para um protesto de bicicleta, já que não há praia por aqui
Não sei nada sobre esse movimento Libéraux de Gauche, que tem certamente um matiz anarquista. Mas acho muito interessante, como fenômeno social, que tenham surgido nos últimos anos uma miríade de organizações políticas à esquerda, para confrontar o capitalismo neoliberal. Elas trazem como bandeira não apenas a emancipação da classe trabalhadora, mas defendem uma idéia de liberdade e hedonismo, na qual se encaixa muito bem a descriminalização da maconha, direitos civis para gays, luta contra o racismo e discriminações sociais. Me lembrei de um jornalzinho trotkista, dos anos 80, chamado Luta & Prazer, que seguia nessa linha mais ampla de luta. Um outro mundo é possível.
O Café de l'Industrie, meu refúgio, quando estou pela Bastille
Muitos dos bobôs que chegam a Botafogo e ao Marché d’Aligre têm essa mentalidade de esquerda, o que torna o processo de gentrification, a partir de sua presença no bairro, um tanto paradoxal. Bem, em Botafogo, há um processo mais explícito de aburguesamento, com os novos condomínios exclusivos e que se isolam da rua. Aqui, os novos moradores — intelectuais, profissionais liberais, artistas, entre outros —, vêm para a região d’Aligre em busca de uma vida mais “autêntica”, algo que se enquadra muito bem na ampla lista de reivindicações da “nova esquerda”. Mas seus hábitos continuam sendo o de uma classe média instruída e com poder aquisitivo razoável. Por meio, sobretudo, do consumo, atraem novos serviços e produção de bens, pressionam os preços da habitação e, sem querer, acabam fagocitando a região, que se transforma definitivamente.
A garçonete do l'Industrie e suas curvas revolucionárias
Bem, enquanto vou refletindo sobre isso, neste sábado de sol e calor parisiense, eis que a garçonete do l’Industrie chega com meu confit de canard, meu prato predileto neste café. Sorvo minha Leffe e observo os movimentos graciosos da serveuse, que anda para lá e para cá, numa coreografia sensual e simpática, desfrutando de seu vestido de verão parisiense (hoje fez mais calor aqui do que no Rio). Seja qual for o sentido de mudança política, em nome de uma justiça social e um humanismo mais solidário, é essa menina, no fim das contas, que desperta o meu mais profundo e íntimo sentido revolucionário. À bientôt!
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