domingo, 24 de abril de 2011

Jantar e jardim comunitários

O realejo ainda encanta as pessoas, sobretudo as crianças. Aliás, a Place d'Aligre é um lugar cheio de música, do sanfoneiro cigano à banda de sopros que tanto me lembram do grupo da Joana em Botafogo...

Paris, 24 abril 2011. Vamos por parte. É tanta coisa acontecendo que perco um pouco o fio da meada. Em ordem cronológica, na quinta-feira passada, portanto um dia antes da visita ao bairro de Goutte-d’or com Idriss Diabaté, estive com Thiago Thiago de Mello, meu primo e mano véio, que aproveitou um seminário em Salamanca para dar uma escapulida a Paris. Apresentei-o ao meu campo de pesquisa e tomamos todas em dois ou três bistrots da região, pois ninguém é de ferro e a saudade, imensa. Estava sem câmera, mas ele fez os registros e estou aguardando o envio para postar aqui.

Conversamos sobre meu campo e sua pesquisa, sobre a música popular brasileira, a partir de um viés bastante singular, que foge dos cânones tropicalistas e da linhagem capitaneada por Caetano Veloso, o que permite um olhar para alguns artistas que estão realmente fazendo uma nova MPB e que não são muito conhecidos. Conversamos sobre Manduka, evidentemente e, mais especificamente, sobre sua passagem por Paris, lamentando não conhecer alguns dos percursos que ele fez naqueles anos 70, quando gravou com Naná Vasconcelos seu disco parisiense.

Eu e Thiaguinho no Penty, encontro histórico no meu terreno de pesquisa. Um chope Leffe merecido cercado de boa energia

Na sexta-feira, ficamos de nos ver, pois queria apresentá-lo ao Idriss, mas as coisas tomaram rumo próprio e o encontro ficou marcado para o Rio. Encontros internacionais são assim mesmo: têm um ritmo todo próprio. Além disso, ele me pegou num momento de alta intensidade na pesquisa, com uma série de eventos e compromissos relacionados à etnografia e a meus affairs acadêmicos aqui. Sei que parece que a vida é moleza e que estudar um bairro a partir de seu mercado, feira, cafés e associações parece uma desculpa para enfiar o pé na jaca, mas o fato é que estou exausto.

Os voluntários preparam a sobremesa do jantar comunitário. Cada um se inscreve para fazer algo, do chef aos ajudantes de cozinha e a turma que ajuda a servir. Entrei nesta última categoria...

Ontem, sábado 23 de abril, dia de São Jorge e aniversário de Marta, por exemplo, fui almoçar com Pedro García Sanchez, professor e maître de conférences do Departamento de Sociologia da Universidade de Nanterre, sendo um dos responsáveis pelos cursos e pesquisas sobre sociologia e antropologia urbanas. Ele também pertence ao Groupe de Sociologie Politique et Morale (GSPM), laboratório da École com o qual meu convênio foi feito. Pedro é venezuelano, mas vive em Paris há muitos e muitos anos. Conheci sua mulher Hèlene e o pequeno Nathanel, de 9 meses.

Foi bom conversar com o Pedro, que pôde confirmar algumas impressões que tive sobre meus colegas da École, sobretudo com respeito à relação entre Boltanski e Thévenot. Mas isso é outro assunto, que cabe mais na rubrica de fofoca profissional. De qualquer modo, Pedro me convidou para dar uma palestra sobre minha tese, abordando o tema da mídia e da imprensa nos dias atuais. Pensei em convidar a Marta para escrever uma parte do artigo, sobre fotojornalismo na Europa, enquanto abordo o processo de mudança, a partir da redação. Como estou lendo Walter Benjamin, me lembrei da brincadeira que Mila Chaseliov fez para dar título à sua monografia, e já batizei o artigo: Le journalisme à la époque de sa reprodution numérique. A idéia é publicá-lo aqui em Paris.

Os velinhos magrebinos se sentam nos bancos da Place d'Aligre todos os dias para pôr o papo em dia

Pedro me apresentou ainda à Patrícia, uma pesquisadora mexicana da Universidade de Los Angeles, que estuda migração e adaptação de imigrantes nos bairros americanos, através dos usos dos idiomas. Almoçamos num ao lado da casa de Pedro, chamado O’Kay Café, no Quai de Loire, no 19ème. Um deck situado sobre o canal de l’Ourcq. Fazia um calor de verão. A temperatura perto dos 30 graus. Até deu uma chuva de excesso de vapor. Mas apenas um arremedo da tempestade tropical. Algumas gotas e só. Logo estiou.

Saí de lá atrasadíssimo para o trabalho na Commune Libre d’Aligre, onde ajudei a servir o jantar comunitário. Foi uma experiência sensacional, embora bastante cansativo. Ajudei a arrumar as mesas, a servir. Éramos uma equipe de três servindo, e cinco na cozinha preparando o menu, que tinha entrada, prato principal e sobremesa. Esse é o tipo de trabalho que o antropólogo tem que fazer. Na verdade, estava trabalhando em minha pesquisa. Pude observar como o Café Associativo da Commune Libre d’Aligre organiza um jantar comunitário e qual é a filosofia de integração das pessoas do quartier. A coisa começou às 20h e acabou quase meia-noite.

Mais imagem da equipe responsável pela bouffe na Commune Libre d'Aligre

Hoje, domingo, fui ao jardim comunitário Aligresse, onde continuei o papo com as pessoas da associação. O jardim é cuidado por voluntários. As pessoas plantam o que quiserem e mantêm tudo anotado numa espécie de diário, onde colocam reclamações, avisos, dicas e até mesmo desenhos de crianças. Há croquis do jardim e caricaturas dos participantes. Há muitas frutas e legumes plantados e, agora que a primavera chegou para valer, é realmente muito bonito.

Bem, é isso por enquanto. À bientôt!

2 comentários:

  1. Pauloti

    ler seus comentários no blog é como estar com você, passeando em Paris...rs. muito interessante!

    Por viver tão intensamente...dá pra entender como deve estar exausto.

    resista!
    sou sua leitora fiel! rsrsr

    bjo
    Cecilia

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  2. Salve Cecilia! Que bom ter você por aqui. Pois é, estou exausto. Ontem, tirei o dia para me recuperar. Dormi horas e horas seguidas...

    E vc? não vem pra cá?

    beijo

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