segunda-feira, 14 de março de 2011

Touche pas à mon voisin!

Os manifestantes na République: não toquem no meu vizinho

Paris, 14 março 2011. Estive concentrado numa série de tarefas e acabei não conseguindo atualizar este diário devidamente. Recapitulo, então, um pouco o fim de semana. No sábado acompanhei Marta na cobertura de uma manifestação em defesa da moradia barata e social e contra os despejos. Os manifestantes se concentraram na praça da République e dali seguiram em passeata, com banda, batuques e um carnaval bem-humorado, com palavras de ordem como touche pas à mon voisin! Muitas bandeiras, mas é perceptível um certo desalento, mesmo entre os militantes mais entusiasmados. O impacto negativo do neoliberalismo na vida cotidiana é um fenômeno que abalou a confiança das pessoas.

Na França, há uma lei que impede que as pessoas sejam expulsas de suas casas, mesmo se inadimplentes, durante o inverno. E, como a primavera começa oficialmente amanhã, é comum nesse período ocorrer uma onda de despejos. Os manifestantes também celebravam o fato da mais alta instância da Justiça francesa ter considerado inconstitucional o artigo de uma lei proposta por um deputado conservador, que permitia a retirada à força de moradores inadimplentes ou invasores em 24 horas. Segundo a Justiça, ninguém pode ser removido (exceto em caso de risco iminente à vida) sem direito a um processo legal.

Além da proteção ao trabalho, o setor de habitação tem sido muito afetado pelos cortes públicos

O que seria um passeio acabou se transformando numa pauta jornalística. E mandei uma matéria para o Globo, que publicou na sua edição de domingo, costurando a manifestação de Paris com notícias de agências internacionais. Houve uma grande passeata em Lisboa e outra, em Madri. Enfim, a Europa tenta se mobilizar contra a onda de cortes em benefícios sociais para reduzir o déficit público dos países e espantar o fantasma de um colapso do euro. Enquanto isso, o capital vai muito bem obrigado, com as corporações e, sobretudo, os bancos lucrando cada vez mais.

No domingo, fui a uma feira no 20eme. Arrondissement que faz limite com Belleville. É incrível a diferença em relação às áreas mais bobotizadas. De novo, ouve-se muito árabe, percebe-se uma forte presença africana e especialmente magrebina. Mas já é visível igualmente os novos moradores de classe média alta nos cafés em torno da feira, prédios antigos sendo reformados e os preços do comércio subindo.

Após a feira, eu e Marta tomamos uma cerveja num café antigo, muito interessante e comemos uma baguette com um queijo da região de Auvergne, maturado. Compramos o queijo na feira e o pão, numa boulangerie perto do café. Aqui, além de pode ficar horas à mesa com uma xícara de expresso, lendo ou escrevendo, também é possível trazer lanches e petiscos de fora e fazer um picnic no bar. Esses cafés menores nem têm garçom. Você tem que entrar, pedir a bebida, pagar e depois ocupar a mesa. Foi o que fizemos.

Marta e a baguette no café tradicional do 20eme: çá c'est Paris!

Depois passamos na casa de Thu e Pierre para editar as fotos do casamento. Acabei aprendendo uns truques incríveis no Photoshop, para corrigir distorções inclusive de lente grande angular. Thu, por sua vez, uma especialista em design e mídia eletrônica, me sugeriu colocar anúncios neste França Fantasma... É uma idéia esdrúxula para mim, mas estou considerando. Ela criou um blog muito interessante, inventando personagens, e o site trata do cotidiano de uma adolescente francesa de origem vietnamita que dialoga com sua avó no Vietnã, falando da sua crise de adolescência e coisa e tal. Está fazendo um sucesso a ponto de atrair anunciantes.

Bem, agora, nesta segunda, tenho uma série de coisas para fazer, como pegar meu cartão da biblioteca da École, aula na Alliance e ver um quarto para alugar. De modo que encerro por aqui essa narrativa. A bientôt!

4 comentários:

  1. difícil imaginar o povo do Rio fazendo passeata para defender vizinhos, ainda mais vizinhos sem eira nem beira. cronicamente inviável. pt, chame a marta para conhecer a ponte mais alta do mundo, que, se não me engano, "sobrevoa" a tradicional e medieval região do Auvergne.

    ResponderExcluir
  2. Pois é, escrevi o nome da região errado... mas enfim, quem sabe não vou visitar a área. Quanto aos vizinhos, o que me chamou mais a atenção é a luta para criar um teto para os preços dos alugueis e dos imóveis para compra e venda, interferindo no mercado e controlando a especulação imobiliária... Se essa idéia pega... Mas o Sarkozy não vai entrar nessa de jeito nenhum... Hoje, vou ver um quartinho na Place d'Italie. Vamos ver. Beijo.

    ResponderExcluir
  3. Paulinho, por meio de seus posts fica evidente o porquê dos franceses adorarem fazer uma greve, passeata ou sejá-lá-o-que-for... é pra dar uma passadinha na boulangerie e comer uns queijos, uma baguete e várias taças de vinho. rs rs Vive la France ! Abração ! do amigo Toco

    ResponderExcluir
  4. Salve, Toquinho! Venha pra cá! Vamos tomar uma cervejinha no meu boteco aqui! Abs!

    ResponderExcluir